Rogerio Wassermann
Da BBC Brasil em Londres
Naidoo, que se tornou conhecido como ativista contra o apartheid em seu país natal, a África do Sul, dirige o Greenpeace desde novembro do ano passado. Ele é uma das personalidades ouvidas pela BBC Brasil como parte da série de reportagens "O que falta ao Brasil?", que discute os desafios do Brasil para se tornar um país desenvolvido.
“O Brasil está bem no caminho da transição entre uma economia ‘emergente’ e uma economia ‘industrializada’. Se eu pudesse dar apenas um conselho para o próximo presidente do país seria isso: Não baseie seu crescimento em modelos que não serviram bem ao mundo”, diz Naidoo.
“Considerando a crise do aquecimento global, apenas os países que incluírem a preocupação ambiental em seus planos de desenvolvimento econômico, tecnológico e social terão sucesso como líderes do futuro”, afirma o ativista.
Mudanças climáticas
Para ele, o Brasil hoje está “à beira de se tornar uma superpotência”, mas pode cair para qualquer lado no que se refere a ser um modelo “verde” para o resto do mundo.
“Nas décadas passadas, as superpotências eram estabelecidas por corridas por acumulação de armas e pelas viagens espaciais. Dado o perigo que o planeta enfrenta hoje como resultado das mudanças climáticas, a corrida hoje somente pode ser ‘verde’”, afirma Naidoo.
Para ele, “ao resistir os estímulos a emular modelos econômicos que provocaram a atual crise ambiental, o Brasil pode provar ao mundo que um novo caminho de desenvolvimento é possível - um com os melhores interesses de seus próprios cidadãos e do resto do planeta em mente”. “O mundo precisa de um Brasil verde”, afirma.
Naidoo disse ter se reunido com os três principais candidatos à Presidência do Brasil e ter ficado impressionado com o interesse aparente deles na proteção ambiental.
O diretor do Greenpeace se disse desapontado, porém, pelo fato de que as questões ambientais importantes, incluindo as discussões sobre o novo código florestal e de infraestrutura urbana, quase não foram tocadas durante a campanha presidencial.
Segundo ele, o Brasil até agora conseguiu manter um “incrível crescimento econômico” sem destruir muito seus recursos ambientais, na comparação com a Europa ou os Estados Unidos.
“Seu território, apesar de pouco menor que o dos Estados Unidos, engloba seis biomas, 62% dos quais ainda cobertos de matas nativas. Vocês têm quase 8% dos recursos mundiais de água doce, e seus rios têm mais espécies de peixes do que todos os rios da Europa juntos. Seu país é o único no mundo com o potencial de conservar a biodiversidade em uma escala continental”, observa.
Segundo ele, o fato de que a matriz energética brasileira é composta em 80% por fontes renováveis pode servir de exemplo para o mundo de que é possível garantir um bom padrão de vida à população sem recorrer ao uso de combustíveis fósseis.
Como comparação, a China tem mais de 90% de sua matriz energética baseada em combustíveis fósseis (carvão, petróleo ou gás natural), apesar de ter construído a maior usina hidrelétrica do mundo, Três Gargantas, que superou em tamanho a usina de Itaipu, compartilhada por Brasil e Paraguai.
Naidoo se diz desapontado, porém, pelo fato de o Brasil “já ter começado a mostrar sinais perigosos de uma inclinação a colocar a produção de commodities acima da proteção ambiental e do respeito aos seus cidadãos”.
Ele critica o fato de, apesar de a matriz energética brasileira ainda ser prioritariamente limpa, a maior parte vem de grandes usinas hidrelétricas, cujas represas provocam um impacto social e ambiental grande.
“O Brasil hoje deveria expandir o uso da tecnologia de pequenas hidrelétricas sem grandes projetos como Belo Monte”, afirma.
Para Naidoo, outro campo para preocupação é o cuidado com as florestas.
“A Mata Atlântica, segunda maior floresta brasileira após a Amazônica, praticamente desapareceu como resultado de desmatamento sem controle. Quase 20% da Amazônia consiste hoje de pasto ou terras degradadas. Quase metade do Cerrado, cerca de 45 milhões de hectares, foram convertidos para o uso agrícola em menos de 20 anos”, cita o diretor do Greenpeace.
“Os biomas remanescentes no Brasil são raramente monitorados e, de uma maneira geral, o controle das florestas em todo o país ainda é extremamente fraco. Em 2008, os satélites do governo registraram quase 3 milhões de hectares de novas florestas degradadas na região”, comenta.
“Hoje 80% da população brasileira vive em centros urbanos, onde um número assustador de 35 milhões de pessoas ainda vivem sem acesso a sistemas de esgoto”, complementa.
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